Pesquise aqui

quinta-feira, 27 de setembro de 2018

CONVITE PARA DEFESA DE TESE


 Eis que meu doutorado se aproxima do porto final, e a universidade pública estará aberta a todos que quiserem me acompanhar durante a defesa da tese intitulada "Profanação de uma imagem do mundo: Mapa de Lopo Homem II, de Adriana Varejão".

A banca se realizará na próxima quinta-feira, 4 de outubro, a partir das 14h no auditório do MAC USP Ibirapuera (Avenida Pedro Álvares Cabral, 1301).

Contaremos com a presença dos professores Drs. Celso Fernando Favaretto, Dália Rosenthal, Erika Alvarez Inforsato e Silvia Miranda Meira, além de minha orientadora profa. Dra. Eliane Dias de Castro. Que bons ventos soprem por nós!

segunda-feira, 17 de setembro de 2018

LER PARA CRER

Foto por Lamparina Luminosa

Entre as diversas sensações que a literatura pode provocar, uma das mais promissoras é o estranhamento. Digo promissora no sentido da experiência estética que desloca o leitor do seu lugar-comum, de maneira a terminar a leitura diferente de como a iniciou. Por vezes confundimos o estranho com o grotesco, o exagerado ou o explícito. Não é a isso que me refiro, mas ao estranhamento tão sutil que chega a ser difícil identificar. Como uma pecinha que não se encaixa no conjunto e gera um ruído. Apenas a escuta atenta é capaz de distingui-lo. No entanto, uma vez percebido, o ruído se transforma numa espécie de “punctum”, para usar o conceito que Roland Barthes criou ao analisar fotografias. Com isso quero dizer que aquele pormenor quase imperceptível, assim que notado, domina a cena, sendo impossível desconsiderá-lo. Ele escapa das nossas convicções e expectativas, incitando-nos a perguntar: por quê? Será isso mesmo? Como é possível?

Foto por Lamparina Luminosa

Tentei explorar essa sensação nos contos do livro Testemunho Ocular, publicado algumas semanas atrás. Ali, o estranhamento está quase sempre associado ao invisível, ao implícito, ao “assassinato do Real”, como dizia Jean Baudrillard. Minha aposta é produzir tensionamentos entre territórios bem delimitados, conhecidos e habitados. De maneira que o leitor encontre nesse atrito a possibilidade de criar junto com o livro, imaginando justamente as imagens que não estão dadas – elas são, no máximo, sugeridas.

É verdade que não antecipei a proposta. Ela foi surgindo na medida em que eu escrevia, e o resultado é um livro de literatura, não uma tese. Durante o processo de criação, quando percebi um fio condutor a atravessar os textos, reuni a coletânea sob o título de Testemunho Ocular, aludindo à condição da imagem como legitimadora de verdades.

Temos ao nosso redor uma lógica perigosa ganhando força política, pautada na certeza e na razão absolutas, opressoras, fascistas na medida em que denegam formas menores de existência. Minha resposta poética para isso é celebrar a ambiguidade, o paradoxo, a obscuridade.

Capa do livro
Testemunho Ocular venceu o concurso da editora Lamparina Luminosa em 2017, e o processo de edição durou cerca de um ano. A definição da capa foi especialmente trabalhosa. Afinal, como é possível escolher uma imagem para um livro que tenta colocar em questão a nossa dependência da visualidade? Nestes tempos em que somos filmados, produzidos e compartilhados a todo instante, qual imagem contrariaria a sua própria vocação de evidenciar, esclarecer e testemunhar?

Eu e Christian Piana, editor responsável pelo projeto gráfico, consideramos diversas alternativas, até enfim concordarmos que os urubus voando em círculos resolveriam a questão sem de fato solucioná-la por completo. Era fundamental que a cena não fosse explícita. As aves têm relação com um dos contos da coletânea, chamado Rapinagem, e à primeira vista parecem lindos passarinhos voando livres no céu. Lá de cima são capazes de testemunhar extermínios das mais variadas ordens, dos quais somos cúmplices.

O projeto editorial condiz com o conceito do livro, que é espelhado desde a epígrafe do início à que o encerra. Há também dois poemas e vinte textos em prosa. No centro se encontra um trecho de páginas pretas com letras em branco, que chamo carinhosamente de “ponto cego”, repleto de provocações, expressões corriqueiras revisitadas e jogos de palavras que tentam escapar dos seus sentidos imediatos.

Foto por Lamparina Luminosa

Se existe um lugar de sobrevivência da literatura neste oceano de esclarecimento em que estamos naufragados, atormentado por ondas de verborragia, realismos e certezas moralizantes, talvez seja a poética do incerto, do não dito, do desvio, do obscuro e do estranhamento que o contato com o diferente pode provocar. Talvez possamos abrir aí uma brecha por onde a ameaça escoe e onde apareçam formas de vida mais contemporâneas.

Gostou? Compre seu exemplar aqui: www.lamparinaluminosa.com

sábado, 15 de setembro de 2018

CRIME PERFEITO

The guest (2004), de Adriana Varejão

o que há de criminoso
no crime perfeito é
a sua perfeição, pois bem:
o assassinato do Real

sexta-feira, 14 de setembro de 2018

ENTREVISTA SOBRE O TESTEMUNHO OCULAR

Concedi a entrevista abaixo ao jornalista e escritor Alex Xavier, que propôs questões sobre o processo criativo e outras um tanto inusitadas a respeito do recém-lançado Testemunho Ocular, meu novo livro de contos. Bateu uma curiosidade? Clique e encomende seu exemplar no site da Lamparina Luminosa.



O que justifica esses contos compartilharem um mesmo livro?
Os contos foram escritos ao longo de vários anos. Com o tempo, percebi que havia entre eles uma inquietação comum, uma espécie de estranhamento com relação às imagens e à visualidade. Foi nesse momento que optei por reuni-los e desenvolver um projeto gráfico compatível. O livro coloca em evidência esse meu interesse pelo inquietante e pelas imagens que, apesar de dominarem nosso dia a dia, são insuficientes em muitos quesitos.

Do que você abriu mão durante o processo do livro? (contos inteiros? ideias desconexas? um palavreado muito formal? seu sono?)
Alguns contos selecionados na primeira versão da coletânea foram excluídos, mas isso faz parte do processo editorial. Acho que não abri mão de muitas coisas. A editora respeitou minhas escolhas e colaborou bastante para a qualidade do livro, tanto gráfica quanto literária. Até mesmo o ano e meio que levou desde a seleção no concurso até a publicação foi bom, apesar de angustiante, porque permitiu que a poeira assentasse, detalhes pudessem ser revistos e as decisões fossem mais acertadas.

Cite uma sugestão de alguém que leu seu livro que mudou a forma como você enxergava o próprio trabalho?
Os amigos do coletivo de criação literária Discórdia leram uma das primeiras versões do livro e fizeram sugestões imprescindíveis. A mais radical talvez tenha sido do Filipe Souza Leão, que sugeriu uma redução de 50% do conto que, por coincidência (ou não?), se chama A Metade de Tudo. Foi quando percebi que, escrevendo menos, era possível dizer muito mais.

Quem (vivo ou morto, famoso ou não) você gostaria que lesse seu livro e comentasse (bem ou mal)?
Por mais que críticas negativas algumas vezes nos ensinem a escrever melhor, todo escritor prefere os comentários elogiosos. Não apenas pelo ego, que de qualquer maneira precisa ser rebaixado para produzir um bom texto, mas principalmente porque o trabalho de escrita é demorado e solitário. Quando o livro chega, após anos de gestação, uma acolhida gentil é sempre bem-vinda. Eu gostaria que Julio Cortázar lesse. Apesar de conhecer pouco da obra dele, tenho um fascínio que é também certo fetiche. O mesmo vale para o Murilo Rubião. Esses são famosos. Porém eu gostaria que muitos leitores comuns lessem e se inquietassem com as histórias, do mesmo jeito que eu me inquieto quando leio outros livros. Para mim, essa é a sensação mais interessante que a literatura pode provocar.

Quem dirigiria uma adaptação de seu livro (ou de um conto específico) para o cinema?
Sou péssimo com nomes de cineastas. Aliás, depois de pesquisar sobre problemas das imagens na arte e na literatura, a relação com o cinema ficou mais difícil. Talvez Wim Wenders fosse um bom diretor para a adaptação. Já o vi, em diversas ocasiões, questionar as imagens cinematográficas de um jeito que mostra certa proximidade com o Testemunho Ocular.

Mencione uma pessoa próxima que não gosta ou não entende sua prosa (e qual crítica essa pessoa costuma fazer).
Não faz muito tempo, minha esposa leu uma dramaturgia que eu estava escrevendo. O comentário foi: bom, você é artista, deve saber o que está fazendo. Ela se esforça para conhecer meus textos, mas eu sei que são muito diferentes do que gosta de ler. Essa distância é boa, no fim das contas, porque traz uma perspectiva diferente e me faz abrir os olhos para demais possibilidades.

Com qual personagem do seu livro sairia para jantar ou levaria para um mochilão pela América do Sul?
Eu tomaria um cappuccino com Lucia, que aparece no último conto, chamado Flashes. Para descobrir o motivo desse encontro, sugiro leia o livro. ;)

O livro Testemunho Ocular está disponível aqui: www.lamparinaluminosa.com

Entrevista publicada originalmente em: Medium / Alex Xavier
Siga o Medium do coletivo Discórdia.