Enquanto nós permitirmos a pena de morte, que é a violência máxima que um governo pode decretar, estaremos todos sujeitados às demais violências advindas dos lados mais diversos.
Enquanto a morte for medida oficial, não haverá controle nem segurança. Não haverá limites. Muito menos limites morais.
Enquanto acharmos que isso é problema [ou "solução"] de outros países, que a pena de morte não nos diz respeito, estaremos virando as costas para os atentados contra a humanidade. E a humanidade é muito maior do que leis locais. E muito maior do que atrocidades culturais.
A pena de morte não é diferente do campo de concentração, apenas acontece com menor quantidade. Ela não melhora nada, nem a sociedade nem o executado. É ingenuidade achar que serve como exemplo, pois só é exemplo de mais estupidez.
Enquanto acreditarmos que a violência é a solução para a violência… tristes de nós.
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"Um dos maiores problemas sociopolíticos da atualidade é a violência. Esta se impõe como uma invariante sempre presente nas subjetividades, que se mostram cada vez mais violentas se as compararmos com as de décadas atrás. Com efeito, a violência sem causa aparente e a violência gratuita se banalizaram no nosso mundo de forma inquietante, e já se transformaram em lugar-comum. Mesmo que a violência não seja gratuita e que tenha boas motivações para exisitr, o que se destaca aqui é a disparidade entre o motivo e a violência desencadeada, como se esta fosse a única possibilidade que se impõe no horizonte do sujeito diante de um impasse e de um obstáculo. Tudo se passa como se ele tivesse perdido a crença na possibilidade de resolver e superar os obstáculos que se colocam para si pelo discurso e pela retórica, isto é, pela negociação com os outros.
(…) Uma marca se destaca na criminalidade atual, de forma inconfundível, e se interesse diretamente à problemática da subjetividade. Estou me referindo à crueldade, que colore cada vez mais os crimes na contemporaneidade. O refinamento assumido pela crueldade deve ser devidamente sublinhado, pois ultrapassa os limiares anteriormente estabelecidos no gesto de matar. Atingimos novos níveis, até então impensáveis. A possibilidade de tirar a vida de outro se dissemina, tornando-se natural assim o assassinato e o genocídio, em que a crueldade delineia frequentemente a cena do crime com pinceladas grotecas e anti-humanas."
Joel Birman, O sujeito na contemporaneidade
segunda-feira, 19 de janeiro de 2015
quinta-feira, 8 de janeiro de 2015
#JeSuisCharlie
Que atitude tem mais chance de fazer um mundo menos ignorante?
a) Cartum
b) Ataque terrorista
"Sobretudo, o problema é evitar o julgamento. Não digo evitar o castigo. Porque o castigo sem julgamento é suportável. Ele tem, aliás, um nome que garante a nossa inocência: a infelicidade. Não, pelo contrário, trata-se de fugir ao julgamento, de evitar ser continuamente julgado, sem que jamais a sentença seja pronunciada. (…) A partir do momento em que temi que houvesse em mim qualquer coisa a ser julgada, compreendi, em suma, que havia neles [meus semelhantes] uma vocação irresistível para julgar. (…) A única defesa está na maldade. As pessoas apressam-se, então, a julgar, para elas próprias não serem julgadas."
A QUEDA, de Albert Camus
a) Cartum
b) Ataque terrorista
"Sobretudo, o problema é evitar o julgamento. Não digo evitar o castigo. Porque o castigo sem julgamento é suportável. Ele tem, aliás, um nome que garante a nossa inocência: a infelicidade. Não, pelo contrário, trata-se de fugir ao julgamento, de evitar ser continuamente julgado, sem que jamais a sentença seja pronunciada. (…) A partir do momento em que temi que houvesse em mim qualquer coisa a ser julgada, compreendi, em suma, que havia neles [meus semelhantes] uma vocação irresistível para julgar. (…) A única defesa está na maldade. As pessoas apressam-se, então, a julgar, para elas próprias não serem julgadas."
A QUEDA, de Albert Camus
sábado, 3 de janeiro de 2015
EXTRADITO
quando digo eu
há quem confunda
com outro eu,
a voz que fala
e aquele que deseja
sumir por trás dela
eu não sou, eu não é
eu não se importa
nem importo a mim,
apenas a voz exporta,
transborda, profana, abomina,
a (mal)criação do autor-deus
candidato fajuto
ao lugar do outro deus
que estava morto
resta a obra
que é toda nossa
antropofagia
há quem confunda
com outro eu,
a voz que fala
e aquele que deseja
sumir por trás dela
eu não sou, eu não é
eu não se importa
nem importo a mim,
apenas a voz exporta,
transborda, profana, abomina,
a (mal)criação do autor-deus
candidato fajuto
ao lugar do outro deus
que estava morto
resta a obra
que é toda nossa
antropofagia
sexta-feira, 2 de janeiro de 2015
INDISCRIMINADAMENTEM
– Loucos não mentem?
– O tempo todo.
– Como podem?
– Inventam. Indiscriminadamente. Acredita?
– Se você diz.
– É verdade, pode acreditar.
– Que loucura. Jamais pensei...
– Sim, mas tem uma coisa: é tudo verdade.
– Como assim?
– As mentiras, tudo verdade.
– Fala sério!
– Eles também. Falam sério, de verdade. Não sabem que inventam. Falam sem pesar a consciência.
– Faz sentido.
– Pode crer. Eu sei que faz.
– O tempo todo.
– Como podem?
– Inventam. Indiscriminadamente. Acredita?
– Se você diz.
– É verdade, pode acreditar.
– Que loucura. Jamais pensei...
– Sim, mas tem uma coisa: é tudo verdade.
– Como assim?
– As mentiras, tudo verdade.
– Fala sério!
– Eles também. Falam sério, de verdade. Não sabem que inventam. Falam sem pesar a consciência.
– Faz sentido.
– Pode crer. Eu sei que faz.
quinta-feira, 1 de janeiro de 2015
SOMOS TODOS ARTISTAS
Capa do catálogo da exposição realizada no SESC Pompeia em 2010 |
A rigidez da homofobia, do
preconceito racial contra negros, dos abusos sobre as culturas e terras
indígenas, por exemplo, deve ser trabalhada, tornada maleável, moldada até
condizer melhor com a realidade de hoje, com as necessidades de espaço e acolhimento,
com direitos sociais respeitados e defendidos por todos.
Seguindo a mesma lógica, os
homossexuais, os negros e os índios precisam ganhar peso político, participar
em mesmo nível que os demais grupos, usufruir dos mesmos direitos. Isso vale
para todas as questões que nos atravessam e para as quais, infelizmente, muitos
viram as costas: legalização do aborto, descriminalização das drogas, violência
policial, jovens em conflito com a lei, dogmatismo religioso na política,
implementação de transportes alternativos como as ciclovias, entre outros
devires menores que clamam atenção. Tudo deve ser moldado: apertado,
experimentado, errado, feito de novo, tentado de outro jeito... até que
finalmente se obtenha forma satisfatória, a qual permanecerá apenas enquanto
for conveniente, pois assim que surgir nova demanda o trabalho terá que ser
retomado.
Beuys falava de "escultura
social". E afirmava que todos somos artistas, uma vez que temos não apenas
capacidade mas obrigação de agir na substância
da sociedade que constituímos e que à sua maneira nos une, alguns queiram ou
não.
Ao propor isso ele expandiu o
território da arte para diversos outros, embaçando fronteiras e modificando o
mapa inteiro no processo. Atuou em organizações políticas, fundou partidos; deu
aulas, criou um conceito próprio de universidade livre; promoveu debates,
participou de eventos em museus, galerias, redes de rádio e televisão;
escreveu, viajou, transformou a si mesmo numa obra de arte com abrangência
mundial e procurou meios alternativos para divulgar suas ideias sobre a
atitude/responsabilidade transformadora que todos deveríamos assumir.
As mudanças começam no próprio
pensamento. Por isso o aspecto conceitual de sua obra é tão importante. É a
partir de uma transformação na maneira de pensar que podemos chegar a uma
melhor concepção de mundo. Por meio da escultura social seria possível alcançar
a emancipação, ou seja, certa liberdade para viver e compartilhar.
Cartaz de Joseph Beuys apresentado na 15ª Bienal de São Paulo, em 1979 |
Quando participou da 15ª Bienal de
São Paulo, em 1979, Beuys reproduziu em cartaz um longo texto escrito no ano
anterior, intitulado Conclamação à Alternativa.
Dele extraí o trecho a seguir, que serve como aperitivo das suas propostas,
traz um alerta imprescindível e surpreende por sua atualidade.
Neste ano que se inicia, após uma Copa do Mundo
catastrófica (não me refiro ao 7 x 1), manifestações sociais no país inteiro,
confrontos políticos violentos e uma 31ª edição da Bienal que, de tão
provocadora e relevante, talvez tenha passada despercebida pela grande mídia,
vale retomar Beuys e refletir sobre os próximos passos. Quem sabe assim
evitamos novos tropeços – e mais graves?
"É preciso alertar contra
uma mudança irrefletida. Diante da questão: O QUE PODEMOS FAZER?, temos de nos
perguntar COMO DEVEMOS PENSAR?, a fim de evitar que o discurso dos mais altos
ideais da humanidade, proclamado atualmente por todos os programas partidários,
continue a se reproduzir como expressão do contraste crasso com a vida prática
da realidade econômica, política e cultural em todo o mundo.
Comecemos
pela REFLEXÃO DE CADA UM SOBRE SI MESMO. Perguntemo-nos sobre as razões que nos
dão ensejo de abandonar o que seguimos até agora. Procuremos as ideias que nos
indicam a direção a tomar nessa mudança de rumo.
Repassemos
a evolução da vida social e política no século 20.
Reexaminemos
os conceitos segundo os quais se estabeleceram as condições reais no Oriente e
no Ocidente.
Reflitamos
sobre o efeito desses conceitos: terão eles incentivado nosso organismo social
e seu relacionamento com as bases naturais, propiciando o surgimento de uma
existência saudável – ou, pelo contrário, não terão tornado a humanidade
doente, não lhe terão aberto feridas, não lhe terão trazido desgraças,
colocando em questão sua própria sobrevivência, hoje? Aprofundemos nossa
reflexão observando cuidadosamente nossas próprias necessidades: estarão os
princípios do capitalismo ocidental e do comunismo oriental abertos para
receber o que vai se revelando cada vez mais claramente, a partir da evolução
dos últimos tempos, como o impulso central na alma da humanidade, ou seja, a
vontade de autorresponsabilidade concreta? Em outros termos, trata-se de um
impulso que leva o ser humano a emancipar-se das relações sociais pautadas
unicamente por mando e submissão, poder e privilégio."
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