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quarta-feira, 7 de julho de 2010

DUAS SENHORAS NO PÓS-COPA



– O Maradona disse que ia ficar pelado.
– Não foi dessa vez.
– Já pensou aquele homem pelado?
– Que desgosto!

(da série " Conversas de rua")

terça-feira, 6 de abril de 2010



"Se me permite, Majestade, há mais indícios a examinar", disse o Coelho Branco, muito afobado, dando um pulo para a frente: "Este documento acaba de ser apreendido".
"O que há nele?", indagou a Rainha.
"Ainda não o abri", respondeu o Coelho Branco, "mas parece ser uma carta, escrita pelo prisioneiro para... para alguém."
"Disso não há dúvida", disse o Rei, "a menos que tivesse sido escrita para ninguém, o que não é comum, como sabe."
"A quem está endereçada?", inquiriu um dos jurados.
"Simplesmente não está endereçada", disse o Coelho Branco; "de fato, não há nada escrito do lado de fora." Desdobrou o papel enquanto falava, e acrescentou: "Afinal de contas, não é uma carta. É um conjunto de versos."
"Estão escritos com a letra do prisioneiro?", perguntou outro dos jurados.
"Não, não estão", diss o Coelho Branco, "e isso é o que têm de mais esquisito." (Todo o júri parecia pasmo.)
"Ele deve ter imitado a letra de outra pessoa", disse o Rei. (Todo o júri se iluminou de novo.)
"Por favor, Majestade", apelou o Valete, "não escrevi isso e não podem provar que escrevi: não há nenhuma assinatura no fim."
"Se você não assinou isso", disse o Rei, "as coisas só pioram. podia ter má intenção, ou teria assinado, como um homem de bem."
A isto se seguiram aplausos gerais: era a primeira coisa realmente sagaz que o Rei dissera aquele dia.
"Isso prova a culpa dele", disse a Rainha.

Trecho de Aventuras de Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll

sexta-feira, 2 de abril de 2010

ANDES




















Pequeno em meio a tanta grandeza, tu te encantas, não há como conter a emoção, ela te invade por todos os poros, a cada inspiração, a cada olhar, a cada sopro de vento ou canto de pássaro. É o deserto para os pobres de alma, o paraíso para os de rica sensibilidade.

É ver o infinito começar seu caminho ilógico a partir dos teus pés.

Beleza imensurável. Se puderes ser parte dela – basta imaginar que tudo se realiza –, se deixares a natureza carregar teus pensamentos e te mostrar a pureza mais pura que já existiu, a pureza da vida primitiva, dos instintos, tu voarás livremente, crescerás com ela, voltarás para casa muito diferente do que sempre fostes; terás experimentado o sublime, ele te transformará e dele jamais te esquecerás.

Não esperes a montanha vir até ti.

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

A BONDADE NÃO DEPENDE DA CLASSE SOCIAL


Sem título (1981), de Jean-Michel Basquiat

Na quarta-feira passada, quando voltava de ônibus para casa, testemunhei um incidente bastante desagradável. Era tarde da noite, véspera da véspera de Natal, e não havia muitos passageiros. Um deles, porém, se destacava – um homem de aparência simples, que trazia consigo uma mochila de mão e uma série de caixas de papelão desmontadas. Ele ficara nas proximidades da porta traseira para não atrapalhar o movimento no corredor. Havia também uma mulher, tão humilde quanto ele, com os braços pensos por causa das inúmeras sacolinhas de supermercado que carregava. Não os vi no primeiro instante, pois estava sentado mais à frente. Sei apenas que, passados dois ou três pontos após o ônibus ter partido, senti a velocidade diminuir. Alguém queria descer. Pois bem, o motorista encostou, a porta se abriu e todos ouvimos os passos na escada de metal. Partimos novamente em seguida. Então, o homem das caixas de papelão começou a gritar: “Espera aí, moço, ela ia subir, ela não queria descer não”. O motorista parou no meio da rua – tinha avançado uns vinte metros do ponto. O homem continuava a gritar, meio assustado, mas não conseguia se explicar.

Depois de algum tempo, compreendi o ocorrido: para abrir espaço ao passageiro que descia, a mulher das sacolas desceu primeiro. Tinha a intenção de retornar ao veículo, só que o motorista não entendeu, fechou a porta e acelerou. Não foi culpa sua, claro, jamais poderíamos imaginar uma situação dessas com tão pouca gente a bordo. Ainda bem que o homem das caixas de papelão percebeu e deu o alerta.

Abriu-se a porta novamente e ele colocou a cabeça para fora. Gesticulou para a mulher, mas ela estava tão injuriada que não queria voltar. Ficamos todos suspensos em sua indecisão e começamos a nos entreolhar.

Eis que o digníssimo senhor ao meu lado, muito bem aparentado, diga-se de passagem, começa a gritar: “Deixa ela aí, motorista. Vamos embora logo!” Era o exato oposto do homem das caixas de papelão, ou seja, sabia se expressar, embora fosse um belo mal educado. Fiquei pasmo. O que ele ganharia com aquele egoísmo? Incomodou-me profundamente. Todo mundo estava cansado. Era Natal, bolas, tínhamos isso em comum. O tal senhor tentou mais algumas vezes, sem sucesso. Balançou a cabeça de um lado para o outro, virou na direção da própria indignação e ficou ali, bufando. Dava para ver o ar que saía de seu nariz embaçando o vidro da janela.

Passados alguns segundos, a mulher resolveu voltar ao ônibus, meio ofendida, meio sem graça. Deixou-nos novamente poucos pontos depois. O homem das caixas ajudou e puxou a cordinha que dá o sinal.
Tive que suportar o repugnante Sir ao meu lado durante mais uns cinco ou dez minutos, até ele descer, finalmente, levando sua tensão estúpida consigo. No lugar, sentou-se o homem das caixas, todo maltrapilho, coitado. Foi o herói do dia e nem percebeu, preocupado que estava com suas caixas, que poderiam cair e bloquear os degraus. Mas elas ficaram quietinhas ali. O ônibus então parou mais uma vez. Eu desci e o homem seguiu viagem. É provável que ainda demorasse muito para chegar em casa.

sábado, 12 de dezembro de 2009

UM PASSADO EM COMUM. UM FUTURO, TALVEZ


Guernica (1937), de Pablo Picasso

É reconfortante saber que tudo à nossa volta não passa da continuação de algo muito maior. É bonito também, somos parte de um processo. Diferentes dos outros animais, jamais começamos do zero; somos agraciados com a herança dos antepassados logo que nascemos. Nossa função, ao longo da vida, é contribuir com a história, continuar a escrevê-la. Há quem proponha novos capítulos, quem acrescente tragédias e comédias; há quem prefira atuar como figurante para assistir ao desenrolar do espetáculo à distância; há quem sequer aparece nele. Ainda assim, cada um tem seu papel. E, seja ele qual for, está em constante diálogo com o passado, pois é nele que encontramos sentido para todo o resto. Somo o que somos apenas porque alguém já foi alguém um dia. E tudo o que virá, virá por nossa causa. Essa é a beleza da vida. É também o peso de nossa responsabilidade.


Assista a esta interessantíssima viagem 3D pela Guernica, criada pela artista nova-iorquina Lena Gieseke:


segunda-feira, 19 de outubro de 2009

HOMENAGEM A HÉLIO OITICICA (1937-1980)

Na noite de sexta-feira, dia 16 de outubro de 2009, um incêndio destruiu grande parte da obra de Hélio Oiticica. Uma perda inestimável para a cultura brasileira. Um capítulo infeliz para a história da arte.



Cosmococa (1973)


Seja marginal, seja herói



Metaesquema expandido no espaço (década de 60)

sábado, 17 de outubro de 2009


sem título, 2004.


Sonhei que havia um espetáculo,
que necessitavam de um voluntário da plateia.

Não me manifestei.

Fui escolhido sob aplausos.
Luzes!, Luzes!
O que quis sonhar com isso tudo?

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

CADERNO DE NOTAS


Desenhando-se (1948), de M. C. Escher

Num velho caderno de notas que tinha ao colo, um jovem escritor, sentado num banco de praça, escrevia sobre um jovem escritor que, sentado num banco de praça, tinha ao colo um velho caderno de notas em que escrevia sobre um banco de praça em que, sentado, um jovem escritor escrevia, num velho caderno de notas que tinha ao colo, sobre o quê escrevia um jovem escritor que, sentado num banco de praça, tinha ao colo um velho caderno de notas em que um jovem escritor, sentado num banco de praça, escrevia, ao colo, sobre um velho caderno de notas de um jovem escritor que, sentado num banco de praça, não mais escrevia notas em seu velho caderno. (EA / fevereiro de 2005)

sábado, 22 de agosto de 2009

SANDMAN


Sandman, de Dave Mckean (personagem criado por Neil Gaiman)

Era como se tivesse areia nos olhos, e aquilo ardia, e por mais que esfregasse, não conseguia acordar. Era o pesadelo da vida a perturbar minha paz interior.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

FANTASMAS


Francis Bacon - Autorretrato, 1971

Na época da faculdade, adquiri olheiras profundas que nunca mais me deixaram. Não foram feitas de estudo ou trabalho em excesso. Devo minhas olheiras às recorrentes madrugadas de bebida, música e bate-papos de internet.