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sábado, 29 de novembro de 2014

todo fim de texto
me convida a voltar,
ler de novo
desde o início
outro texto
recém-criado
se existe
a vontade de negar
aquela existência
é
necessário
admitir que está
no mundo

[ignorar, apagar.
de onde vêm
tais vontades?
de que sentimentos
se alimentam?]

a existência de qualquer
algo específico, talvez genérico
incômodo discordante,
por demais concordante

[só vira questão
quando bate a crise]

excessos da existência
não sei por quê
da negação

deveria saber
por que privá-la de tudo?
a decisão espera por nós.
o juízo é nosso, infelizmente
a sentença é nossa
alçada

seja qual for
o motivo de tamanha violência
a existência ainda existe
resiste
continuará existindo
quando nós não mais

[tamanha importância tem
o nosso próprio ser
e estar]
lugar tão pequeno revelou-se
labirinto em que conhecer
significava se perder

[para Bem Diante dos Meus Olhos, um livro porvir]

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

A SABEDORIA DA INCERTEZA

“O que quer dizer o grande romance de Cervantes? Existe vasta literatura a esse respeito. Há os que pretendem ver nesse romance a crítica racionalista do idealismo obscuro de Dom Quixote. Outros veem nele a exaltação do mesmo idealismo. Ambas as interpretações são errôneas porque pretendem encontrar na base do romance não uma interrogação, mas um preconceito moral.
      O homem deseja um mundo onde o bem e o mal sejam nitidamente discerníveis, pois existe nele a vontade inata e indomável de julgar antes de compreender. Sobre essa vontade estão fundadas as religiões e as ideologias. Elas não podem se conciliar com o romance a não ser que traduzam sua linguagem de relatividade e de ambiguidade no próprio discurso apodíctico e dogmático. Elas exigem que alguém tenha razão; ou Anna Kariênina é vítima de um déspota obtuso, ou então Karenin é vítima de uma mulher imoral; ou K., inocente, é esmagado pelo tribunal injusto, ou então por trás do tribunal se esconde a justiça divina e K. é culpado.
      Nesse ‘ou – ou então’ está contida a incapacidade de suportar a relatividade essencial das coisas humanas, a incapacidade de encarar a ausência do Juiz supremo. Devido a essa incapacidade, a sabedoria do romance (a sabedoria da incerteza) é difícil de aceitar e de compreender.”

A arte do romance 
Milan Kundera

terça-feira, 4 de novembro de 2014

creio,
entretanto,
no porém.

todavia até
certo ponto
convém considerar
que não devo, nego
afirmo acaso pudesse.

ora! que nada.
nesse meio tempo subo
no muro observo
ambos os lados
um de cada olho,
outro a contrassenso
afastando a luz
com a palma
da mão daqui
até o infinito
e além